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O Mundo Sem Armas

Consegue imaginar um mundo sem armas?

Não? É bem fácil, na verdade… É só olhar para trás…

Mas é possível voltar a ter um mundo sem armas?

Não creio. Na verdade, não acho que seja o caso de lutar por isso.

A existência de armas não é o real problema. A meu ver o principal problema é o uso ou ameaça de uso de força ou violência para a resolução de conflitos.

Voltemos na imaginação ao mundo sem armas, de qualquer espécie, não apenas armas de fogo.

Estávamos então competindo por recursos de sobrevivência, nas mesmas condições de outras espécies animais, contando apenas com a constituição física e a força de nosso corpo.

Para nos defendermos de ataques de outras espécies ou atacá-las e também para competir com outros da nossa própria espécie, não havíamos desenvolvido chifres ou presas duros e pontiagudos, pele grossa ou carapaças.

Provavelmente restos mortais de outros animais foram incorporados ao incipiente arsenal de pedras e paus da raça humana.

Desde o início é impossível distinguir ataque de defesa quando falamos da finalidade da confecção de artefatos que possam ser caracterizados como armas.

O que parece sensato afirmar é que o desenvolvimento de armas responde a uma necessidade de se fortalecer na luta pela sobrevivência.

Neste esforço, a espécie humana foi inegavelmente bem sucedida frente a outras espécies, tendo levado muitas à extinção ou redução drástica.

Na competição contra outros seres humanos, suponho que o mais fraco busca inicialmente diminuir sua desvantagem, numa atitude típica de defesa.

Mas não cessa quando alcança a igualdade, mesmo porque o mais forte tentará manter ou reestabelecer sua superioridade.

Até aqui, na linha do tempo evolutivo da espécie humana, apesar de termos driblado os limites biológicos por meio da engenhosidade na criação de artefatos, estamos ainda condicionados por mecanismos em que a competição pela sobrevivência e pelos recursos necessários a ela pressupõe o uso ou ameaça de uso de força, se necessário ao custo de outras vidas.

É somente quando a conquista de abundância dos recursos necessários à sobrevivência diminui a competição que nos vimos em condição de questionar o uso da violência contra nossos semelhantes e mesmo contra outras espécies.

É aqui que nos encontramos em nosso processo evolutivo. Desenvolvemos novas estratégias, consolidadas em regras e costumes que caracterizam nosso estágio civilizatório.

As questões que deveríamos estar tentando solucionar são:

Como garantir uma sociedade mais igualitária, de modo que menos pessoas precisem apelar para a violência para garantir sua sobrevivência.

Como criar, aperfeiçoar e manter um sistema policial e judiciário que proteja a população de atos violentos de qualquer natureza ou motivação, punindo a contento os culpados.

Isto exige muito aprofundamento do debate e elevação do nível das discussões, com envolvimento da sociedade, comprometimento dos agentes públicos, seriedade das políticas públicas etc.

Como este quadro geral da evolução e do progresso da humanidade está muito distante da realidade diária e, consequentemente, da percepção da maioria das pessoas, estejam elas em qualquer posição, de bandido, vítima, policial, juiz…, e como as condições descritas ao parágrafo anterior encontram-se ausentes há muito tempo na sociedade brasileira, muitos são os que se têm rendido à ideia de que a solução é cada um se armar para defender a si e à sua família.

Esta hipótese é humanamente impossível (nenhum pai de família, por mais bem intencionado, bem treinado e bem armado, vai estar presente em todo momento para proteger a todos os seus familiares), socialmente inaceitável (a segurança pública é obrigação constitucional do Estado brasileiro, não podendo ser transferida a cada um dos milhões de preocupados e ocupados pais de famílias) e, civilizatoriamente, que é o que me interessa, um atraso lamentável.

Lula e Bolsonaro

Não se trata de um post sobre a política brasileira atual. Não há espaço para isso neste blog sobre ideias.

Tampouco interessa-me a polarização sobre qualquer assunto e o título diz Lula e Bolsonaro, e não Lula x Bolsonaro.

O que pretendo é propor uma reflexão sobre uma determinada hierarquia que imagino deva ser observada tanto entre as ideias e como entre aqueles que as concebem e defendem. Assim como há ideias grandiosas e também mesquinhas, haverá pessoas mais ou menos relevantes.

As grandes ideias somente são assim percebidas, em sua plenitude e importância, sob uma perspectiva histórica. Podem até já nascer taludas, a depender do tempo e das circunstâncias a que servem de resposta, mas podem também nascer pequenas e crescer à medida em que permanecem puras, intactas, válidas e aplicáveis por séculos a fio.

Grandes ideias, enfrentando e sobrevivendo à inexorável erosão dos séculos, inspiram grandes homens e mulheres a desempenhar feitos notáveis e admiráveis, bem como servem de referência e agrupam pessoas a seu redor.

Tomemos o exemplo da democracia Americana. Os ideais libertários, igualitários e humanitários que a infirmaram, enunciados e defendidos à época, continuam fazendo-se ouvir, pois ainda são invocados, com legitimidade, propriedade e coerência pelos atuais líderes, sem deixar de fazer referência e prestar reverência aos líderes que no passado os definiram.

Já no Brasil, o que vemos? Um país em que o culto à personalidade é tão forte, não cultua a personalidade e as ideias de nenhum vulto histórico?

Será que não existe alguma ideia na nossa história cuja grandeza seja reconhecida por toda população como ideal a ser defendido com afinco ou ninguém que possa ser identificado como o personagem histórico que a tenha concebido ou defendido?

Serão Lula e Bolsonaro os fundadores da nossa Pátria?

Colors


versão livre para a canção do Black Pumas

Acordo antes das três da manhã 
Pensando o que eu posso fazer
Sempre quero algo mais
Do que sempre ser igual ao ao ao
Que passou
Logo, logo estaremos por triz
De voltar ao normal
E ser igual
Tomara que não, não, não
Que tal
Fazermos diferente?
Olharmos para frente
Deve existir um jeito
De decidir sem medo
Depende só da gente
É preciso ouvir
E refletir
Apesar de sermos diferentes
Existe sempre um jeito
De decidir sem medo
Depende só da gente
Nossos erros ancestrais
Ideias que não nos servem mais
Entranhadas, arraigadas, ofuscadas
Devem ficar para trás
Porque não ser, ter, querer, crescer
É só pensar, falar, deixar, mudar
O mundo real e o do jornal
Nunca foi igual
Ao que imaginei
E é por isso
Que eu digo que é preciso
Fazermos diferente
Existe sempre um jeito
De escolher sem medo
Depende só da gente
Há uma ideia nova 
Há uma outra opção
Existem vários jeitos
De decidir sem medo
Depende só da gente
É preciso ouvir
E refletir
Apesar de sermos diferentes
Existe sempre um jeito De decidir sem medo Depende só da gente

Democracia: vítima ou cura para o coronavírus?

Para fazer frente à crise pandêmica, seria fundamental dispor de informações de qualidade e incontestáveis ​​sobre a doença: sua etiologia, sua patogênese, seus padrões de disseminação e contágio, seus sintomas, seus tratamentos e suas consequências e sequelas.

Como sabemos, ainda não dispomos dessas informações e essa falta de conhecimento é o que espalha o impacto da Covid19 dos quartos, enfermarias e corredores dos hospitais para nossas casas, escritórios, fábricas, áreas públicas e meios de transporte.

Esse impacto tremendo e abrangente afeta todos os níveis, desde o círculo individual e familiar até os construtores da agenda política e econômica internacional.

São muitos os agentes envolvidos, com diferentes entendimentos da situação, interesses e motivações; as discussões vão desde a origem do próprio vírus até a emergência de uma ordem global totalmente diferente.

Nem um único pensamento sobre essas questões é consensualmente acordado. Em vez disso, quase todos eles caíram no grande caldeirão fervente da opinião pública, aquecido pela paixão de um fogo alimentado pela falta de informação e atiçado por interesses econômicos e políticos.

Nesse cenário de turbulência, os processos de tomada de decisão são clara e inevitavelmente comprometidos. De diretrizes e estratégias globais e nacionais de saúde pública e economia às atividades cotidianas das pessoas comuns.

Desde o início, os governos centrais deveriam ter assumido o papel de liderança na disseminação de informações, fornecendo-as de forma clara, tecnicamente fundamentada, cuidadosa, inequívoca, uniforme e , sobretudo, de forma politicamente isenta.

Para isso, porém, teria sido necessário dialogar, ouvir e levar em conta pontos de vista divergentes ao longo do processo. Quanto menos espaço para a troca de ideias civilizada e democrática, mais temas vão se polarizar e se politizar, o que só é bom para quem quer aproveitar o momento para fazer manobras políticas e eleitorais.

A democracia me parece a única forma de contornar a falta de informação que está prejudicando nossas decisões. Pessoas com ideias diferentes deveriam não confrontar-se, mas admitir que nenhum dos lados possui as informações necessárias para tomar melhores decisões para a maioria da população, sem deixar de atender aos interesses das minorias.

Coronavírus: pandemia ou pandemônio?

31/03/2020 07:42 – Coronavirus: pandemia ou pandemônio?

Para lidar-se com a crise da pandemia, é essencial cuidar da qualidade da informação sobre a natureza, extensão e gravidade do problema; os agentes envolvidos, sua participação e suas motivações; a discussão, a tomada de decisão e suas implicações e desdobramentos: tudo enfim que compõe um cenário que se modifica mais rapidamente que em tempos normais.

Já desde o momento inicial, o governo Central deveria ter assumido o protagonismo do papel de divulgação de informação, provendo-a de forma clara, tecnicamente embasada, ponderada, inequívoca, uniforme e, principalmente, politicamente isenta.

Para isso, no entanto, é preciso dialogar, ouvir e levar em consideração pontos de vistas divergentes durante todo o processo. Se não há espaço para troca civilizada e democrática de ideias, o tema logo se polariza e se politiza, o que só é bom para quem quer se aproveitar do momento para executar manobras políticas.

A conhecida falta de interesse do Presidente em abrir canais de comunicação com setores além dos que garantiram a sua eleição e em melhorar seu relacionamento com a imprensa tem cobrado seu preço, inflacionado agora pela crise.

Não estou dizendo que concordo ou discordo do que ele fala, apenas que a forma como trata a informação e a comunicação, tanto quanto a falta, atraso e descoordenação na adoção de medidas (que abre espaço e até mesmo exige, a tomada de iniciativas por outras esferas da administração pública e até mesmo da sociedade civil, o que vem acontecendo de forma voluntariosa, solidária, mas improvisada, desordenada e, em alguns momentos, temerária) está transformando uma pandemia que era para ser só uma gripinha num pandemônio para a população e numa ameaça à estabilidade política do seu governo.

Texto recuperado do WhatsApp, datado de 31/03/2020. Editado em 10/08/2020.

O impacto de argumentos falaciosos

Infelizmente, há muito conteúdo nitidamente falacioso, alguns notadamente de má-fé, em todos os canais de produção e distribuição de informação. (Esta afirmação não é conclusão de nenhum argumento, nem a medição objetiva e comprovada dos fatos, apenas minha percepção, preocupação e motivação para continuar escrevendo)

O impacto de uma informação falsa, tendenciosa, imprecisa, é difícil ser medido, mais difícil ainda ser reparado em toda a extensão de suas consequências.

Creio que estamos presenciando um efeito de espiral viciosa em que a proliferação de conteúdo falacioso provoca um aumento polarização indevida de temas e é retroalimentada por este aumento do radicalismo e da intolerância, com consequências de proporções desastrosas para o ambiente político e para a harmonia da sociedade brasileira.

Tudo isso porque, embora esteja mais fácil produzir, disseminar, pesquisar, verificar conteúdo, dentro do ambiente digital, a maioria da população optou por apenas disseminar, compartilhar aquilo que lhe parece verdadeiro, acreditando com isso estar a exercer seu direito de expressar o que pensa.

A mídia digital favorece a participação ativa da população, mais do que a mídia tradicional, mas a qualidade desta participação tem deixado a desejar.

Poucos produzem conteúdo original. E entre estes, estão os que produzem conteúdo tendencioso, falso, manipulador, pois já notaram o poder de infiltração e a vulnerabilidade dos usuários.

Normalmente, o conteúdo nos é empurrado de alguma forma, ainda que pareça que foi escolhido por nós. Seja abusando das ferramentas de disseminação de conteúdo, seja pela atuação de algoritmos que direcionam esta escolha, afunilando nossas opções ao invés de escancará-las.

Poucos questionam o conteúdo que se lhes apresenta. Poucos vão atrás de outras fontes.

Muitos, no afã de manifestar opinião sobre toda variedade de assuntos não se tem feito acompanhar de igual afã de aprofundar-se no seu conhecimento, e o que vemos são milhões de pessoas a concordar e repassar conteúdos, sem análise crítica alguma.

Se, em condições normais um argumento falacioso não resistiria ao confronto com a veracidade dos fatos ou a validade das ideias que o infirmam, atualmente, o fato de não termos um ambiente digital propício ao debate de ideias, faz com que seu impacto multiplique-se na velocidade com que é compartilhado.

Por outro lado, embora todos devam se responsabilizar pelas consequências das ideias em que baseiam suas ações e da forma que as disseminam, de modo a reparar eventuais danos causados a outras pessoas, a velocidade de disseminação dos conteúdos não se faz acompanhar da mesma velocidade e efetividade em repararem-se-lhe os efeitos negativos.

Desta forma, numa espiral viciosa, vê-se substituir o debate aberto, democrático, republicano por retaliações de igual tom e calibre, nivelando por baixo a qualidade da informação, num diálogo de surdos-mudos.

EVITEM DISSEMINAR O LOROTAVÍRUS

COMBATAM A PANDEMÍDIA

Guia das Falácias

Demonstrar a fragilidade de um argumento é bem mais simples do que parece. Sobretudo, é muito mais fácil e proveitoso do que investigar e tentar provar as intenções da pessoa ou grupo de pessoas que o elabora, sustenta, defende ou dissemina.

O que torna um argumento frágil? O principal mal de que padece uma argumentação é a presença de falácias em seu interior. Essas falácias assumem diversas formas e se inserem nos argumentos como um vírus, contra o qual a maior parte da população não tem imunidade.

Ao contrário da pandemia, para combater a pandemídia devemos não usar máscaras e não podemos simplesmente lavar nossas mãos.

O Guia das Falácias, de Stephen Downes, com tradução e adaptação de Júlio Sameiro pode não ser a panaceia, mas não tem contra-indicações nem efeito colaterais nocivos. Pode ser usado sem parcimônia para detectar e evitar a propagação destas pragas!

https://criticanarede.com/falacias.html